Espécie exótica ameaça não só a nossa carnaúba, mas toda a Caatinga

3 de maio de 2022 - 14:06

    Quem sempre trabalhou ou trabalha no campo deve conhecer ou pelo menos ter escutado, sobre a praga que causou danos irreparáveis à produção de algodão do Ceará, o bicudo-do-algodoeiro. Neste momento, agricultores cearenses estão “deveras” preocupados com o impacto devastador da unha-do-diabo (Cryptostegia madagascariensis) sobre a carnaúba. “Vamos trabalhar a médio e longo prazo para buscar uma solução”, disse Artur Bruno, titular da Secretaria do Meio Ambiente (Sema), sobre a questão que reuniu na tarde desta segunda-feira (2/5), no auditório da Sema, grupo multidisciplinar formado por 35 pessoas, para discutir o problema.

    A reunião foi uma iniciativa de agricultores, produtores, sindicalistas e políticos das regiões produtoras da Copernicia prunifera ou carnaúba, no estado do Ceará. Para o agrônomo, Raimundo Ribeiro Sales, presidente da Câmara Municipal de Miraíma, na Mesorregião do Noroeste cearense , é preciso uma ação urgente. “É a única atividade sustentável do meu município, se chove produz se não chove produz também, além de remunerar bem os agricultores. A urgência é cuidar da carnaúba, pois a madagascar está acabando não apenas os carnaubais, mas está atacando todas as espécies nativas”, afirmou.

    O representante da Irauçuba, vereador Francisco Xavier Azevedo, alertou para o risco econômico, além do ambiental. “Em Irauçuba não é diferente, até o pasto está sendo afetado, nem a malícia pega. O meu município já realizou audiência pública para explicar a problemática”, afirmou. A unha-do-diabo é uma trepadeira exótica e invasora, importada cerca de 40 anos de Madagascar, como planta ornamental, cresce em volta do tronco da carnaúba, sufocando-a e impedindo a absorção de luz solar, matando a palmeira. O mesmo acontece com outras plantas nativas do ecossistema único da Caatinga.

Urgência

    O sindicalista Jailson Monteiro, do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Senador Sá, disse que na sua cidade, “tanto na zona urbana como na rural, a presença da invasora é muito forte, a planta está parada e não sabe se defender”. Ele também destacou a educação ambiental, as parcerias e a divulgação do tema. “Não podemos falar em Desenvolvimento Sustentável, no Ceará, sem a carnaúba”, declarou. Para José Almir Barros, do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Morrinhos, é preciso agir rapidamente para não perder o recurso natural tão importante. “Estamos falando de uma atividade econômica, de cultura e de meio ambiente e o estado ”, afirmou.

    O representante da Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Ceará (Fetraece) declarou que a instituição está acompanhando o debate e que a pesquisa pode ser um caminho. “Estamos preocupados! Havemos de encontrar mecanismos biológicos para o controle dessa invasora”, disse. Também lembrou que a indústria, por ser um setor que pode contribuir muito para a erradicação da praga, deve ser chamada. Atualmente, a cera de carnaúba é o sexto maior produto da pauta de produção e exportação do Ceará.

Pesquisa para combater invasora

    A Associação Caatinga, convidada pelo secretário Bruno, participou da reunião. A ONG tem muito expertise quando o assunto é o bioma Caatinga. O coordenador de Educação Ambiental, Sandino Moreira, informou sobre uma pesquisa que trata do controle biológico da unha-do-diabo. “A ideia do projeto é buscar em Madagascar, uma espécie de fungo que faz o controle da invasora”, explicou. Segundo o educador, a pesquisa já foi realizada e o resultado é muito promissor. “Na Austrália tiveram o mesmo problema e já deu certo”, completou. A SC Johnson, o Sindcarnaúba e a ADECE patrocinaram o estudo.

    O político, Inácio Arruda, ex- titular da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Educação Superior do Ceará (Secitece), lembrou muito bem a importância da carnaúba, destacando que a mesma está representada na nossa bandeira. “ A carnaúba tem um peso, é uma cultura nossa, uma atividade econômica com um potencial de riqueza extraordinário e está sendo afetada por essa praga que está alastrada em todo o território cearense”, alertou. Para Arruda é uma praga difícil de ser controlada, exige estudo, pesquisa e portanto, cabe no escopo do Programa Cientista chefe Meio Ambiente. “. “Vamos centralizar a questão na Sema e acionar as secretarias, de Desenvolvimento Agrário (SDA) e a de Desenvolvimento Econômico e Trabalho (Sedet)”, sugeriu.

    O atual secretário de Ciência, Tecnologia e Educação Superior, Carlos Décimo, colocou o abraço da unha-do-diabo, na árvore da vida, da providência e de onde se aproveita tudo, além de e símbolo do Ceará, na mesma situação do bicudo nas plantações de algodão e agora, o peixe-leão, que invade nossos mares. “Pode causar um grande problema na nossa economia e no Semiárido”, disse. Assim como Arruda, ele afirmou que o tema cabe muito bem na concepção do Cientista chefe. Criado na atual gestão da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap), órgão vinculado à Secitece, o programa tem como objetivo unir o meio acadêmico e a gestão pública.

Encaminhamento

    O secretário Bruno, encerrou a reunião, antes informando que a Sema receberá em breve, dois modernos drones que muito vão contribuir para o mapeamento do problema e muito ajudará a orientar a pesquisa em gestão e controle da unha-do-diabo. “Vamos trabalhar juntos, colocar a demanda no escopo do Cientista chefe, levantar as pesquisas que já foram feitas e, de imediato, levar a questão para a governadora Izolda. Saiam daqui com a certeza que vocês acertaram ao buscar o Governo do Ceará para uma solução do problema”, encerrou. Desse grupo foi criado um Grupo de Trabalho (GT) Frente de Combate da Unha-do-diabo.

Saiba mais

– A reunião foi provocada pelos municípios de Cruz, Massapê, Acaraú, Amontada, Irauçuba e Miraíma. Juntos, enviaram requerimento à Sema com o objetivo de buscar recursos financeiros e apoio, sob o nome de Bolsa Verde, “para recuperação, preservação e conservação da Carnaúba e proteção da biodiversidade no estado do Ceará; criação de políticas públicas de capacitação para cultivo, manejo, exploração sustentável, preservação e replantio da carnaúba; criação de projeto de combate a praga conhecida como unha-do-diabo, que hoje é grande ameaça ao setor carnaubeiro e à sobrevivência da biodiversidade na Caatinga”.

– O Brasil é o único país do mundo que produz cera de carnaúba. A produção é estimada em 18.000 toneladas de cera por ano. Os estados de Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte e Maranhão são os maiores produtores.

– A natureza agressiva da unha-do-diabo, se deixada sem controle, pode ter um impacto devastador sobre a diversidade da flora do Ceará.

– No link https://www.sema.ce.gov.br/flora/programa-de-valorizacao-de-especies-vegetais-nativas/arborizacao-urbana-e-especies-exoticas/ , no site da Sema, tem um folder sobre espécies exóticas invasoras e que trata inclusive da Cryptostegia madagascariensis . A Secretaria coordena o Programa de Valorização de Espécies Nativas (Lei Estadual N° 16.002/2016) que tem entre os seus objetivos e ferramentas, implementar uma política de valorização das espécies vegetais nativas no Estado do Ceará, bem como a substituição gradativa de espécies exóticas invasoras, de áreas públicas e privadas.